sábado, 22 de setembro de 2012

Todas as manhãs

Eu procuro você na cama extremamente vazia, que o outro lado agora não está preenchido por roupas e livros e bagunça como sempre. Talvez ele esteja arrumado assim dando espaço pra alguém o ocupar, apesar de nós dois cabermos em só metade da cama, quando a outra metade era um caos. Nunca me importei em dormir na beira da cama, de lado, envolta nos seus braços. Era melhor do que ter ela inteira só pra mim, lembrando-me de que você não vem hoje à noite jogar vídeo game até sentir sono e depois dormir comigo apertadinho como se eu não tivesse aula amanhã. Sinto falta das minhas desculpas pra faltar a aula no sábado de manhã serem você, e não de faltar a semana toda sem motivo nenhum. Eu sei, eu sei. Eu tenho que focar nos estudos, tenho que me distrair, seguir em frente. Eu sei. Nunca ouvi tanto esses conselhos como nesse último mês. "Você merece alguém bem melhor", "você está bem melhor sozinha", "ele não te merece, nunca te mereceu", "vocês estavam em épocas diferentes, com cabeças diferentes, ele ainda é uma criança". Sabe, to cansada de ouvir isso. Alguém tem alguma outra desculpa? Melhor em que sentido? Mais bonito, mais inteligente, mais compreensivo? Mereço. Mas quem disse que não me bastava o pouco que ele era? Porque bastava...
Substituir amor, só com outro. Tem escapatória. Não to dizendo que não vou amar de novo, que não vou te substituir, porque eu vou, porque você não é insubstituível. To dizendo que ta difícil substituir as outras coisas. Colocar alguém no seu lugar enquanto você ainda arde vivo em todos os cantos da casa, do peito, da cidade. Construir tantas memórias e tirar mais fotos e ganhar mais presentes. Acumular tudo. Porque as memórias, as fotos, os presentes, tudo ainda ta aqui. Faço o que com eles? Eu ainda não sei. Apesar de ter passado bastante tempo, eu ainda não sei. Não te espero voltar, não te quero de novo. Mas não sei o que faço com tanta lembrança. Te jogo fora durante o dia todo, mas você volta à noite e me assombra em todos os sonhos, e eu lembro de cada um vivamente. Acordo sem a mínima noção de que era sonho, procuro você nas cobertas, no celular, na cabeça. E aí lembro que não vou te achar. Te amaldiçôo mentalmente. Choro baixinho, e não sinto vontade de levantar da cama. Todas as manhãs.
Eu só acho tão ridiculamente patético viver tanto tempo com um pessoa, construir uma fortaleza junto com ela, sonhos, esperanças, brincadeiras, confiança, e simplesmente abandoná-la. A fortaleza. Fingir que nada aconteceu, que nada existiu, que não se conhecem mais. Essa é a parte mais escarnificante do ser humano. Apesar de conhecê-la tão bem, não consigo deixar de me surpreender. As pessoas são tão insensatas quando acham que ignorando as memórias e deixando algo inacabado, vão se livrar de todo o resto. O muro, a fortaleza, ta de pé ali, ó. Pode ver. E isso, felizmente, é a única coisa que ninguém derruba, nem mesmo quem o construiu.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Desconhecido

A novidade tornou-se velharia, e as pessoas têm essa mania tosca de trocar o velho pelo novo, mesmo sabendo que panela velha é que faz comida boa. Mesmo sabendo que a próxima novidade vai ser empolgante - momentaneamente -, mas que o desconhecido tem muitos pontos fracos. Intimidade, brincadeiras, apelidos, carícias, medos, vícios, compreensão, colo, choro, entendimento, facilidade, coração aberto, e amor - claro -, não se encontra no desconhecido. Quando o brilho ficar fosco, você vai deitar na cama querendo o abraço de uma pessoa só, e te garanto que não é do desconhecido. Você vai sentir falta da mão te procurando do outro lado da cama no meio da noite no escuro, te encontrando afastado e chegando perto pra envolver tuas costas com os braços. Esse tipo de calor não dá pra substituir. Você vai se encontrar sábado a noite em casa, meio sem rumo e chão, pensando no que fazer. Seu celular vai tocar e inconscientemente você vai achar que ela, mesmo sabendo que não é, e você vai dar um suspiro de alívio. Alívio por não ser ela, alívio porque você não queria que fosse ela, não queria trazer tudo à tona. Seus amigos vão te convencer a ir pra alguma festa, sem dificuldade nenhuma, e você já vai de carona com o intuito de beber muito e esquecer de tudo. Pode beijar uma, duas, ou quantas bocas quiser. Elas serão pequenas ou grandes demais para a sua, engraçadas e diferentes. Não é tão bom. A novidade faz parecer melhor do que realmente é. Você a afasta por um segundo e olha nos seus olhos, não verdes, procurando alguma coisa, que também não sabe o quê. Ela vai sorrir e o sorriso vai ser branco e bonito e não como você tava acostumado. Por um segundo bate um desânimo, mas você joga fora, ignora. Cinco da manhã você chega em casa, com aquela sensação de que ta faltando alguma coisa. Tira toda a roupa, as lentes, e deita na cama sentindo um frio absurdo que nenhuma coberta consegue cessar. Um frio que vem de dentro pra fora e esmaga o peito, e você aceita que é só a bebida te dando mal estar. Tem coisas que uma noite de festa não consegue te dar, tem faltas que desconhecidos não conseguem suprir. Um domingo vazio, de vídeo game e um almoço clichê. Sempre uma incógnita tua semana, mas também teus apoios e escapes. A vida te deu um tapa e mandou você aguentar e fingir que nada aconteceu. Você é fiel demais a isso. Leva em frente como se tivesse e quisesse aceitar a nova realidade, com lembranças afogadas no canto do cérebro. Você não vai voltar atrás porque se acha melhor do que isso. E você é. Atrás não tem mais nada, você está certo em escolher seguir em frente. Mas a opção de ir sozinho ou acompanhado é só sua.

sábado, 1 de setembro de 2012

Venci(da)

O silêncio ocupou o espaço que era dos risos e das conversas. Qualquer lugar era o lugar perfeito pra olhar desde que não fosse um para o outro. Dois corpos que não sabiam mais preencher o mesmo espaço e não estavam na mesma sintonia, mas insistiam em tentar. Tentar, não sei pra quê, porque na verdade era um tentando e o outro apenas levando em frente; ou não levando a lugar nenhum. Os olhos se encontravam, mas não se achavam, não se entendiam. As palavras não faziam mais sentido e por isso eram poupadas. Levamos muito tempo numa brincadeira meio sem razão e meio sem entender nada, jogando fora e depois catando de volta. A perda não é fácil pra ninguém. Nós sabíamos, mas não entendíamos. Nunca faltou amor. Não faltou atração, nem cumplicidade. Somente morreu a palpitação no coração e o frio na barriga e a sensação de conquista. Mas nós não tínhamos morrido, apenas não sabíamos mais nos reinventar, e desistir parecia mais fácil. Mais fácil pra você, pelo menos.
Você queria desistir e eu queria insistir. Uma briga que só teria um fim e a gente sabia. Mas nenhuma guerra é de verdade se um dos lados não insistir, não é? E lá fui eu, espada numa mão e escudo na outra, tentar buscar o que perdemos. A verdade é que eu já tinha jogado meu escudo fora há muito tempo, e minha espada não tinha mais ponta. Eu lutei por força do hábito. Eu lutei por acomodação. Lutei porque não quis aceitar que tinha que sair da nossa rotina e do nosso castelo, mesmo vendo ele desmoronar a minha volta. Eu lutei porque era a única coisa que eu sabia fazer ainda, e de tanto ter feito, tornou-se automático. Minha reação era lutar e tentar manter unido o que não tinha mais ligação. Mas se me perguntassem, eu não saberia explicar porque estava na guerra. Eu olhava pra você e implorava um pouquinho de ajuda, mas você jogou a toalha, rendendo-se. Não sei porque gastei as últimas palavras sabendo que eram em vão. Não sei porque tentei continuar em algo que eu nem sabia mais se era o que eu queria. Não sei porque eu hesitei em vez de aceitar a derrota. Força do hábito. Amor, talvez.